18 janeiro, 2011

Sem o básico não é possível o superior

Autor: Carlos Henrique Araújo

Hoje, a falta de excelência do ensino superior é exposta de forma contundente em exames como o da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB. Em média, há a aprovação de apenas 15% dos bacharéis em direito que se submetem ao teste. Sem tergiversação, a realidade é que a imensa maioria dos concluintes dos cursos de direito não possuí o conhecimento necessário para exercer a profissão para a qual foi treinada por quatro ou cinco anos.

É muito provável que se houver uma investigação mais detida dos resultados auferidos pelos reprovados haverá a constatação de que as dificuldades dos recém-formados são as mais básicas; conectam-se ao baixo grau de domínio da língua e a uma sofrível compreensão por meio da leitura. São dificuldades que deveriam ter sido resolvidas ou superadas no ensino básico.

Em 2010, quase 70% dos estudantes de medicina que se diplomaram pelas universidades do Estado de São Paulo foram reprovados numa prova aplicada pelo Conselho Regional de Medicina de São Paulo. Os jornais informaram que esse resultado teria sido o pior em seis anos de aplicação do teste. Diferentemente do exame da OAB, a adesão dos estudantes de medicina é voluntária e passar na prova não é pré-requisito para a habilitação do médico ao exercício profissional.

Uma rápida leitura dos resultados do antigo sistema de avaliação do ensino superior no Brasil – o apelidado de Provão – é desalentadora. É fácil perceber que os estudantes apresentam deficiências básicas de conhecimento da língua materna, não têm o hábito da leitura, carecem de instrumentos matemáticos e lógicos e não dominam conceitos científicos elementares, seja sobre a natureza, seja sobre os homens e suas instituições.

Pouco informados e sem nenhuma autonomia para buscar conhecimentos sozinhos, os estudantes brasileiros de ensino superior, principalmente em cursos menos valorizados economicamente, são repetidores de clichês, despreparados para o exercício da profissão e dependentes de tutela para o desenvolvimento posterior dos seus estudos.

O resultado de um ensino superior tão deficitário é que o mercado de trabalho é obrigado a absorver um contingente grande de profissionais mal preparados em áreas vitais para o País e para a vida em sociedade, tais como a medicina, o direito e o magistério. Outro efeito é a superprodução de formados que não irão exercer a profissão para a qual se dedicaram e consumiram recursos financeiros.

Não é por acaso que as maiores deficiências de atendimento ao público no Brasil estejam concentradas nas áreas de Saúde, da Justiça e da Educação. Exibimos serviços sofríveis de saúde pública e com defeitos e disfunções em serviços de saúde privada. Nosso ensino público é um recordista mundial de resultados negativos e o acesso à Justiça é baixo e o grau de eficiência do sistema jurídico deixa muito a desejar.

A baixa qualidade do ensino superior no Brasil é fruto, dentre outras causas, de décadas de falta de qualidade da educação básica. O baixo desempenho escolar e a alta incidência de reprovação no ensino fundamental condicionam e, praticamente, inviabilizam um ensino superior útil e de excelência no Brasil.

Só haverá mudanças positivas na formação superior e profissional dos brasileiros quando houver soluções para os problemas enfrentados no cotidiano do ensino básico. Não há como modificar problemas de aprendizagem que se arrastam durante anos em um tempo escasso para aprender uma profissão. Com um ensino básico ruim, estamos fadados a uma péssima formação superior.

http://www.artigonal.com/ensino-superior-artigos/sem-o-basico-nao-e-possivel-o-superior-3907042.html

Perfil do Autor

Mestre em Sociologia, consultor, ex-diretor do Inep/MEC. chfach@gmail.com

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